Ao longo dos anos, a produção de cinema no Brasil sofreu com uma de altos e baixos. Períodos marcados pela ascensão do Cinema Novo, das Pornochanchadas e do Cinema Marginal foram abafados por uma intensa crise econômica, que atingiu um de seus piores momentos durante o governo de Fernando Collor, no início da década de 1990.
Ministérios, órgãos e leis de incentivo à produção audiovisual foram extintos, porém o cinema nacional ressurgiu das cinzas em um movimento conhecido como Retomada. Carlota Joaquina, Princesa do Brazil (1995), dirigido por Carla Camurati, é considerado um marco do Cinema da Retomada, levando mais de um milhão de espectadores às telonas.
Até o início dos anos 2000, a quantidade de longas-metragens brasileiros só cresceu, e um dos mais emblemáticos do nosso cinema é reconhecido por concluir a Retomada e ajudar a consolidar uma nova fase de fomento à sétima arte nacional: “Cidade de Deus” (2002).
Baseado no livro homônimo de Paulo Lins, com roteiro adaptado por Bráulio Mantovani, o longa foi codirigido por Kátia Lund e Fernando Meirelles, e é um dos primeiros trabalhos cinematográficos da dupla. Desde então, Meirelles esteve à frente de outros filmes aclamados, como “O Jardineiro Fiel” (2005), “Ensaio Sobre a Cegueira” (2008) e “Dois Papas” (2019).
Um ‘favela movie’ de dentro para fora
Zé Pequeno, personagem de Leandro Firmino, ficou eternizado como um dos marcos do cinema nacional após 'Cidade de Deus' Imagem: Divulgação
Em 30 de agosto de 2002, “Cidade de Deus” estreou em menos de cem salas espalhadas pelo Brasil — quantidade que, mesmo para os padrões do cinema nacional, é bastante tímida.
Com a intenção de retratar o surgimento de uma das maiores favelas do Rio de Janeiro, trazendo personagens e suas vidas que se entrelaçam à história da região que o intitula, um dos diferenciais do era o seu elenco.
Apesar de contar com atores consagrados na equipe, como Matheus Nachtergaele, “Cidade de Deus” trouxe atores e não atores da própria favela e de outras comunidades periféricas cariocas. Alexandre Rodrigues, Jonathan Haagensen, Douglas Silva, Seu Jorge e tantos outros nomes fizeram parte da iniciativa, o que ajudou o filme a chegar ainda mais próximo da realidade do local escolhido como cenário, e gerou uma identificação potente na audiência. Em poucas semanas, mais salas de cinema passaram a exibir o longa, que foi visto por milhões de brasileiros.
“Dadinho é o caralh*, meu nome agora é Zé Pequeno”, frase dita pelo ator Leandro Firmino, entre tantas outras, caíram no gosto popular e alavancaram o sucesso do filme.
Prêmios e reconhecimento internacional
Alexandre Rodrigues e Alice Braga em 'Cidade de Deus'; filme que completa 2 décadas revolucionou o cinema nacional Imagem: Divulgação
“Cidade de Deus” não apenas ganhou o público geral, que abraçou o filme nas salas de cinema do Brasil: o longa também foi aclamado pelos críticos e especialistas, sendo exibido e premiado em diversos festivais de cinema mundo afora.
A pré-estreia mundial aconteceu no , um dos mais renomados eventos da sétima arte. Embora não tenha participado da competição, Cidade de Deus chamou a atenção de quem assistiu, e foi destaque no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, Festival de Cartagena, BAFTA, e outras premiações.
Em 2003, após seu lançamento no circuito internacional, o filme pôde enfim tornar-se elegível para o Oscar. Assim, na cerimônia da Academia do ano seguinte, Cidade de Deus concorreu em quatro categorias: Melhor Direção, Roteiro Adaptado, Edição (para Daniel Rezende, diretor dos filmes da Turma da Mônica) e Fotografia.
Há 20 anos, mais de 3,3 milhões de brasileiros assistiam a “Cidade de Deus” nos cinemas, e hoje, ele é o segundo filme não-estadunidense mais visto no planeta. Pouco tempo depois de sua estreia, novas leis e iniciativas ajudaram a dar fôlego às produções nacionais, e o longa, sem dúvida, corroborou para que o nosso país e o restante do mundo enxergassem a potência e excelência da sétima arte brasileira.