Ney Matogrosso faz show sem concessões no Rock in Rio

Foto/Reprodução.

Gente de esquerda critica Ney Matogrosso porque ele não se manifesta ostensivamente a favor de políticos e partidos de esquerda.

Gente da comunidade LGBTQIAP+ critica Ney Matogrosso porque ele não levanta ostensivamente as bandeiras da homossexualidade.

Em contraposição, ouvi certa vez de um cara que é homossexual e, portanto, tem lugar de fala, que “até o corpo de Ney Matogrosso é de esquerda”.

São questões que me ocorreram depois que vi o show de Ney Matogrosso domingo (22) no palco Sunset, do Rock in Rio, para uma plateia pequena e pouco entusiasmada.

Ney mostrou parte do show da turnê Bloco na Rua, posta na estrada em 2019. O tempo estabelecido para os artistas no Rock in Rio não permite o setlist completo.

O show, de repertório impecável, vai da marcha Eu Quero é Botar Meu Bloco na Rua, de Sérgio Sampaio, ao rock – fechando o bis – Pro Dia Nascer Feliz, do Barão Vermelho.

Entre uma e outra, tem Rita Lee (Jardins da Babilônia), Raul Seixas (A Maçã), Paralamas do Sucesso (O Beco), Mutantes (Balada do Louco) e Chico Buarque (Tua Cantiga).

Sangue Latino, do tempo dos Secos e Molhados, encerra o programa antes do bis numa surpreendente versão rock’n’ roll. Meio Rolling Stones, meio Rita Lee.

Ney Matogrosso abriu o primeiro Rock in Rio, em 1985. Tinha 43 anos. Ney Matogrosso está no Rock in Rio de 2024, que celebra os 40 anos do festival. Agora tem 83 anos.

Pro Dia Nascer Feliz evoca o sucesso que esse rock fez na voz de Ney num álbum de 1983. E remete a Cazuza, no Rock in Rio de 1985, saudando a democracia que começava a renascer no Brasil. O show do Barão Vermelho foi no dia da eleição de Tancredo Neves.

Ney Matogrosso é um dos grandes artistas da música popular brasileira. Sua trajetória, desde que, em 1973, surgiu nos Secos e Molhados, dá conta dos últimos 50 anos do Brasil, esse país que sobrevive entre impasses e superações.

Ney Matogrosso é um artista imenso. Ele não precisa se manifestar ostensivamente a favor de partidos e políticos de esquerda. Ele não precisa levantar ostensivamente as bandeiras da comunidade LGBTQIAP+.

Já está tudo no seu permanente espírito transgressor. Do jovem que cantava Sangue Latino, nos Secos e Molhados, ao homem de 83 anos que faz um show sem qualquer concessão no Rock in Rio, em evidente contraposição ao lixo da atualidade que se incorporou ao festival e mudou o perfil do evento.

“Eles são muitos, mas não podem voar”. Está na letra de Pavão Mysteriozo, que o cearense Ednardo cantava em 1974. Está no canto de Ney Matogrosso, meio século depois. Preciso desenhar?

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